“CAPOEIRA É TUDO O QUE A BOCA COME”: faces educativas de uma cultura negra no Pará.
Capoeira; Educação Física; CONFEF/CREF´s; Esporte; Cultura; Pará.
Este trabalho problematiza a implementação do Conselho Federal de Educação Física e dos Conselhos Regionais de Educação Física (CONFEF/CREF´s) e sua repercussão no Pará em relação à prática da Capoeira, a partir da Lei 9696/98. Esta lei, possibilitou, dentre outras coisas, limitar a prática da Capoeira a uma atividade física esportiva sujeita a intervenção exclusiva do Profissional de Educação Física, gerando tensões com os praticantes de Capoeira. Visando compreender a relação tensa entre as duas instituições de saber, foi analisado o modo como a Capoeira tem sido apresentada nos currículos da Educação Física do Instituto Federal do Pará (IFPA) – Campus Tucuruí, da Universidade Federal do Pará (UFPA) e da Universidade do Estado do Pará (UEPA), três campos de referência para o ensino público da Educação Física no Pará. A pesquisa também analisou os diálogos e conflitos entre os e as praticantes de Capoeira do Pará e o Conselho, com enfoque nas construções de resistências dos capoeiras frente às tentativas de apropriação da Capoeira emanadas pelo CONFEF. Visando compreender os limites da apropriação da Capoeira pelo sistema, foi realizado trabalho de campo junto a um grupo de Capoeira Angola denominado Malungo Centro de Capoeira Angola, para analisar se suas práticas culturais estão além ou não da concepção de Capoeira do sistema CONFEF/CREF´s e do alcance dos currículos da Educação Física no Pará, especificamente do IFPA – Campus Tucuruí, da UFPA e da UEPA. As principais fontes foram entrevistas concedidas por representantes do CREF18, Mestres de Capoeira do Pará, as resoluções internas dos Conselhos, os comunicados e a página eletrônica do sistema CONFEF/CREF´s. O método do procedimento técnico dessa investigação em que favoreceu a orientação e análise objetiva do estudo dos fatos foi baseada na metodologia da história oral (THOMPSON, 1992), análise documental e atividade de campo, como etnografia (BRANDÃO, 1999). Em relação à historiografia da capoeiragem paraense lançou-se mão dos estudos de Leal (2008) e Salles (2015), no caso da Educação Física brasileira, de Castellani Filho (1994) e Neira e Nunes (2009). Referente ao sistema CONFEF/CREF´s, especificamente, a pesquisa sucedeu-se via documentos, artigos científicos, fontes digitais da página oficial do CONFEF, dissertações, teses, leis, entre outras. Durante o estudo de caso foram verificados evidências e fatos concretos de intervenções do sistema CONFEF/CREF´s na Capoeira e as resistências dos e das capoeiristas de vários lugares do Brasil, Nozaki (2004). No Pará, as estratégias dos capoeiras, como forma de resistência, foram múltiplas. Variava da adesão parcial à sabotagem sutil ao sistema. Uma relação tensa, mas reveladora da ausência de afinidades entre as duas instituições. Visando compreender os sentidos próprios da Capoeira em relação ao tema da Educação Física, após realizar trabalho de campo junto ao Malungo Centro de Capoeira Angola, considerado como tradicional em relação à prática da Capoeira, observamos sentidos e práticas que não cabiam na definição de Educação Física dada pelo sistema CONFEF/CREF´s. Longe de ser apenas “uma atividade física esportiva”, a Capoeira vivenciada no Malungo Centro de Capoeira Angola se revelou como um instrumento de educação cultural cuja densidade não cabe nas definições de formação exclusiva do Profissional de Educação Física. Os resultados revelaram um distanciamento imenso entre as duas instituições de saber. Apesar de ambas possuírem caraterísticas educacionais em suas bases, a prática da Capoeira não se limita aos aspectos esportivos. Trata-se de uma prática cultural negra com imensa potencialidade para a educação e a formação de identidade. Enfim, a Capoeira pode estar na Educação Física, porém a Educação Física talvez não esteja e não seja Capoeira.