Gestão Compartilhada do patrimônio arqueológico na Amazônia: conflitos e desafios entre o oficial, o legal e o real
Patrimônio arqueológico; política preservacionista; gestão compartilhada; desenvolvimento.
Esta tese apresenta a ampliação conceitual do termo patrimônio cultural trazida pela
Constituição Federal de 1988. Feito isso, contextualiza os reflexos dessa ampliação na política
preservacionista do Brasil, a partir do século XXI. Ao recepcionar a ampla compreensão de
patrimônio cultural defendida pela CF/1988, a nova política de preservação busca o
rompimento do paradigma tradiconalista, de modo a permitir o protagonismo da sociedade civil
na gestão do patrimônio cultural. Assim, vislumbra garantir o acesso e usufruto dos bens
culturais a todos, bem como viabilizar o exercício da cidadania e a sustentabilidade de
populações locais. Classificado como patrimônio cultural pelo artigo 216 da CF/1988, os bens
arqueológicos estão contidos nesse conjunto de desafios. Ao ter-se em vista essas
transformações paradigmáticas, o estudo aqui apresentado buscou compreender como o
alargamento semântico do termo patrimônio cultural e a (re)orientação da política cultural
nacional vêm se desprendendo do campo discursivo e transformando-se em práticas
democráticas e emancipadoras na gestão dos bens arqueológicos, na Amazônia. O estudo
objetiva analisar o processo de inclusão de populações locais na gestão do patrimônio
arqueológico, nos estados do Amapá e Pará, de modo a entender a atuação do poder público
para o fomento e apropriação dos bens culturais, com foco nos pilares da sustentabilidade.
Metodologiacamente, a pesquisa se desenvolveu a partir da interação entre os métodos
etnográfico e qualitativo. Os resultados apontam para a posição periférica da sociedade na
gestão do patrimônio arqueológico. Com uma gênese vinculada a um projeto modernista, a
política patrimonial nacional alicerçou-se em uma visão ocidental do mundo e consolidou uma
prática centrada na presevação de monumentos. Assim, epistemologias e processos culturais
dissonantes são desqualificados pelas estratégias de gestão. Na Amazônia, essa prática ignora
os múltiplos modos de apreensão do patrimônio arqueológico, por parte de populações locais.
Ademais, conhecimentos e epistemologias locais são negligenciados pelo amplo aparato legal
formado em torno do patrimônio arqueológico. Por tais motivos, na região, a política oficial de
preservação, a legislação de proteção e a realidade das populações locais se chocam e dificultam
a efetivação das diretrizes que orientam a política patrimonial atual. Dito de outro modo, o
oficial, o legal e o real caminham em sentidos distintos e centralizam a gestão dos recursos
arqueológicos na figura do Estado e dos especialistas do patrimônio.