Comunidade flutuante Lago Catalão, Iranduba (AM): um assentamento ribeirinho sobre as águas
Amazônia brasileira, morfologia, assentamento flutuante, comunidade ribeirinha, Lago Catalão (Iranduba-AM)
Este trabalho objetiva compreender a produção socioambiental de um tecido urbano sobre as águas, da comunidade Lago Catalão, Iranduba AM, evidenciando sua natureza híbrida (urbana e natural), na simbiose estabelecida entre habitantes ribeirinhos e o meio, na capacidade de autogestão e de adaptação dos habitantes para garantir sua subsistência e sociabilidade, aspectos valiosos para o contexto atual do planeta. A comunidade se localiza na ilha de Xiborena, na confluência dos Rios Negros e Solimões, em área de várzea convertida em periferia da Região Metropolitana de Manaus. Esse assentamento é autoconstruído e autogerido sobre as águas, com morfologia espacial adaptativa para atender as necessidades cotidianas dos seus habitantes, e permitir a adaptação às lentas mutações da paisagem, e aos regimes dos rios, que apresentam cheias e estiagens cada vez mais intensas no atual contexto de mudanças climáticas. Processos globais e interesses econômicos impactam no espaço urbano, com a negação e a desestruturação de territórios, que possuem potencial reconciliação entre urbano e natureza. Os arranjos espaciais, que se adaptam ao regime de cheias e vazantes dos rios, e dependem dos serviços estendidos da terra firme, são sazonais e não reconhecidos por cadastros oficiais, apesar desse tipo de comunidade flutuante ser histórica na região, com registros de erradicação desde os anos 1960. Prevalece na comunidade uma consciência espontânea e uma consciência socioespacial de pertencimento por meio das quais são (re)produzidos arranjos espaciais flutuantes, responsáveis pela configuração do lugar e da identidade territorial ribeirinha desta comunidade, e que divergem das matrizes urbano-industriais, por estarem livres do contexto da propriedade privada ou posse da terra, dissolvendo-se os conceitos de lote, quadra e rua. O assentamento é compreendido a partir da perspectiva do urbano extensivo para apreensão das contradições nas espacialidades e temporalidades inerentes à dinâmica interna do espaço urbano amazônico, mais especificamente Região Metropolitana de Manaus (RMM) e a partir da relação do assentamento com o sítio, dinâmicas ambientais e econômicas existentes. O recurso às técnicas de análise morfológica associada aos levantamentos a partir de imagens de satélites, permitiu a codificação de como essa comunidade se relaciona com o ecossistema, e se estruturou ao longo dos anos. Evidenciou-se a simbiose estabelecida entre a população ribeirinha e seu meio construído, e a relevância dessa capacidade de adaptação para sua subsistência e sociabilidade. A apropriação das águas no Lago Catalão está relacionada à construção de um tipo de habitat ribeirinho negligenciado sob a perspectiva da Zona Franca, mas de grande relevância para a compreensão da condição de vida de comunidades mantidas fora da concepção de cidade formal brasileira, e tão comum no contexto amazônico. A produção socioambiental do espaço desta comunidade ilustra a utopia de equilíbrio entre urbano e natureza, denominada por Monte-Mór (1994, 2006, 2015) como urbano-natural.