Retrocedendo em progresso: dissecando a simbologia pessoal do ator no processo de criação do espetáculo O tudo anexo.
Simbologia. Inconsciente. Atuação cênica. Individuação. Mitologia.
O presente memorial corresponde à parte descritiva, tanto quanto a vislumbres, que nortearam opções poéticas do espetáculo O tudo anexo, cujos princípios metodológicos de criação correspondem à investigação de uma simbologia pessoal do ator. Tais princípios, conforme vimos examinando, tendem a habilitar o artista da cena ao alcance de um estado criativo alimentado por uma simbologia compartilhada no inconsciente coletivo. Aquisitivos transversalmente das singularidades relativas à experiência simbólica de cada um, tais princípios, sem embargo, e em continuidade, parecem incitar o ator rumo ao alcance de um estado criativo alimentado por uma simbologia ímpar compartilhada no inconsciente coletivo. Entre eles estão a noção de mitologia criativa, de Joseph Campbell, segundo a qual existe um novo tipo de experiência mitológica emergente, onde o indivíduo experimenta símbolos, e a mitologia de maneira íntima e transformadora, cuja comunicação de tal experiência - desde que verdadeira - teria a força de um mito vivo. Em consequência, o trabalho do artista cênico, nesse contexto, se faz valer pela exploração, manuseio e comunicação da matéria dessas experiências. Nisto, alertamos quanto à elucidação da diferença de perspectivas entre essa mitologia e a mitologia considerada tradicional, impositora, socialmente, de convenções e ritos, conquanto falha no processo de alcance espiritual desses. Outro princípio metodológico, ou transformador, é o da individuação da psicologia analítica junguiana, onde os símbolos advindos do inconsciente têm papel fundamental no amadurecimento da psique do indivíduo. Estruturalmente, o espetáculo acima referido se complementa com memorial escrito e memorial poético, ambos erigindo questões, propondo diagnoses e definindo parâmetros ao emprego da simbologia pessoal do ator na criação cênica. No caso do memorial poético, correspondências imagéticas e escriturais insurgentes no processo criativo são exploradas de forma a contribuir ao entendimento via expressão metafórica de princípios criativos abordados. Quanto ao trajeto do pensamento criativo, este se permite calcado na experiência simbólica, em suas pertinências transformadoras e numinosas, em suas nuances frente ao trabalho do ator e à encenação, tanto quanto as qualidades próprias das suas especificidades, dificuldades e fluxos que deram luz ao processo de composição dramatúrgica, sonora, espacial, enfim, cênica. Por meio dos ensaios investigativos voltados a uma conduta de encenação apta a explorar o nível simbólico de forma a extrair, do ator, ao máximo, as suas potências simbólicas, buscamos prover consistência investigativa na prática. Ademais, elucidamos o caráter empírico da metodologia, aquele surgido das experimentações, da lida frontal com o símbolo, em laboratórios de atuação cênica. Dentre os referenciais teóricos podemos destacar Friedrich Nietzsche (1844-1900), no que tange ao entendimento do filósofo alemão sobre e a filosofia do instinto e sua crítica à superestimação do conceito de consciência, o diretor polonês Jerzy Grotowski (1933-1999) e os princípios criativos de seus experimentos junto ao seu Teatro Laboratório que, dispostos em conjunto, receberam o nome de Teatro Pobre, e Gilbert Durand (1921-2012), quando relacionadas às suas noções de imaginação simbólica, termo caro a esse filósofo francês, e aqui apropriado quanto a elucidações de símbolos elementares e urgentes, situados no imaginário coletivo, nas mitologias e nas amplitudes individuais, entre outras efetuações.