UMA ANÁLISE FENOMENOLÓGICA DAS NARRATIVAS DE PSICÓLOGAS (OS) SOBRE O TRABALHO NO SISTEMA PRISIONAL
Fenomenologia. Prisão. Psicologia. Complexidade
Na dissertação apresentamos as narrativas de quatro psicólogas (os) no contexto de atuação no sistema prisional paraense, descrevendo inicialmente, a complexa construção do cárcere, caracterizada por um conjunto de expressão de tensões, violência e desafios para aqueles que o compõem: os profissionais, nos vários modos de atuação; os custodiados; as formas de inserção; e os familiares. Considerando que as percepções dos
psicólogos foram os elementos empíricos, situamos que a psicologia no âmbito jurídico é uma das bases teóricas, a partir da legalização da profissão e criação da Lei de Execução Penal; somada a reflexão da fenomenologia de Edmund Husserl sobre os conceitos de epoché, redução e atitude fenomenológica, bem como mundo da vida; a elementos do pensamento de Martin Heidegger no sentido, de interpretar e compreender as estruturas existenciais das narrativas das Psicólogas, considerando nas análises de suas práticas as condições da temporalidade, historicidade, responsabilidade e cuidado implicadas no trabalho nas unidades prisionais. Esta fundamentação permite o entendimento das ações das profissionais entrevistadas no cenário psicossocial carcerário, em que são confrontadas duas grandes demandas dos custodiados: saúde e reintegração social. Os
objetivos da pesquisa foram: compreender os significados que as (os) psicólogas (os) atribuem às suas práticas cotidianas; sistematizar as narrativas sobre as atividades e os suportes institucionais que têm e que gostariam de ter; identificar se nas práticas psicológicas há atos de cuidado fundamentados na garantia de direitos. Colaboraram com a pesquisa quatro psicólogas (os) preenchendo formulário eletrônico no Google Forms;
em seguida responderam a entrevista semiestruturada por videoconferência no Google Meet, sendo o processo realizado em um mês, aproximadamente. Incluímos na pesquisa psicólogas (os) com registro ativo no CRP10, vínculo institucional via concurso público, maiores de 18 anos, e com mais de cinco anos de experiência profissional. Para as análises e compreensões das narrativas, utilizamos o modelo de Amedeo Giorgi em que foi
possível construir eixos temáticos. Dentre os resultados temos: prática do diálogo entre a psicologia e o horizonte técnico na orientação do cuidado à pessoa privada de liberdade; práticas que asseguram, ainda que, limitadamente a dignidade e humanização do público atendido; ressonâncias no espaço laborativo quanto a precarização do vínculo institucional, tanto nos limites do estado, quanto nas relações imediatas com agentes da
segurança, sendo demarcadas pela lógica da disciplina e poder; o lugar de escuta e compreensão clínica situado na fronteira entre saúde, principalmente no seu aspecto biomédico, e reintegração, compreendida pelo retorno ao convívio com a sociedade após cumprimento de sentença, mediada por decisões jurídicas. Concluímos que a pesquisa reafirma a relevância do trabalho de psicólogas pautado no cuidado, o que contribui para enfrentar os preconceitos associados a população carcerária; que é possível a Psicologia contribuir para críticas e atualização do movimento automático e restritivo presentes na lógica do encarceramento. Por fim, ponderamos sobre a necessidade de configurar mais diálogo entre sociedade, estado e profissionais da saúde que atuam nas unidades carcerárias baseada em um projeto político-social, articulado com abordagens psicossociais e orientação ética para pensar e criar circunstâncias de possibilidade de uma prática criativa nas instituições dentro e fora do ambiente carcerário.