O retrato do Maler-Denker: a filosofia pictórica do "segundo" Nietzsche
Pintura. Filosofia. Devir. Imagem. Pensadores-Pintores.
O conhecimento filosófico há muito se vincula ao ver e a visão e o correlato destes termos em grego nos fornece jargões epistemológicos tradicionais na história da filosofia (théorein – contemplar, examinar, meditar e eidós – ideia, visão). O vínculo entre o instinto dos olhos e a sapiência humana remonta uma espécie de história do ver que acompanha pensamentos fundamentais da cultura ocidental, por conseguinte na filosofia também, por exemplo, no mito da caverna de Platão. O objetivo geral do trabalho é delinear os principais contornos da imagem do filósofo nietzschiano proposto pelo Maler-Denker. Considerando-se a importância e grande repercussão da tradição metafísica, a imagem (Bild) tradicional do filósofo é problematizada em Nietzsche, pois diferente do metafísico, os pensadores-pintores (Maler-Denker) exprimidos em Humano, demasiado humano (KSA 2, p. 36, 387) articulam um conhecimento filosófico sob as condições da questão do devir, e deste modo abalam profundamente os fundamentos da filosofia metafísica. Destacando-se a especificidade do pensamento nietzschiano frente às “disposições e tarefas” metafísicas, observa-se que o segundo aforismo da primeira parte de Humano aponta precisamente o defeito hereditário da tradição filosófica: o sentido histórico. Grosseiramente dito, na perspectiva nietzschiana a tradição metafísica carece de sentido histórico, pois não compreende a questão do devir, e neste sentido, justamente ela vem aqui orientar as considerações sobre o olhar e o conhecimento desses filósofos retratados por Nietzsche. Assim, num primeiro momento, este trabalho procura delinear a Filosofia dos pensadores-pintores dentro do contexto da tradição metafísica do platonismo, que articula o problema das relações entre Pintura e Filosofia, e desdobra em seguida, no pensamento nietzschiano, num dos momentos estratégicos na história do ver, a possibilidade de uma pintura da vida, no entanto, subsumida à pertinência da questão do devir, e não como sistemática imagem imóvel. “A tarefa de pintar o quadro da vida, por mais que tenha sido proposta pelos escritores e filósofos, é absurda (...). Naquilo que está em devir, um ser em devir não pode se refletir como algo firme e duradouro, como um ‘o’” (KSA 2, p.387).